terça-feira, 3 de janeiro de 2012

Ano novo, salário novo e desejo de consumo renovado


A partir de 01/01 o novo mínimo vigorando em todo o território nacional passou a ser de R$ 622,00. A imprensa e o varejo de uma forma geral celebram a distribuição de renda. Não é pra menos, afinal são R$ 64 BILHÕES de reais nas mãos de trabalhadores assalariados ávidos por consumir celulares, câmeras digitais, notebooks, tablets, televisores de LED ou LCD das mas variadas dimensões além de tantos outros produtos apresentados como indispensáveis. E à farra do varejo unem-se bancos e administradoras de cartão de crédito celebrando o espetáculo do endividamento.

Mas que mal há em se consumir aquilo que se deseja? Será que só a classe média pode andar de carro enquanto o trabalhador e sua família tem que sofrer o pão que o tinhoso amassou dentro dos ônibus lotados por todo o país? Não! Nada disso! É justo, mais do que justo, justíssimo que os trabalhadores que tudo produzem tenham acesso ao conforto e a modernidade. O que questiono aqui é a forma como as tais "necessidades" são construídas. Os desejos e as vontades pelo supérfluo são alimentados dia após dia na cabeça de milhares de pessoas transformadas em meros "consumidores" como se pequenos diabinhos com cara de Ciro Bottini lhe gritasse ao pé do ouvido: Compre, compre compre! E os consumidores simplesmente consomem. Como já disse antes, o salário mínimo precisaria ser quatro vezes maior para que uma família de quatro pessoas tivesse acesso digno à alimentação, saúde, transporte, moradia, lazer... e mesmo sendo a quarta parte do que precisaria ser é em boa parte direcionado às fornalhas do consumo sem sentido.

O que escrevo aqui não tem nada de papo-cabeça ou filosofia de mesa de bar. A grande maioria das pessoas conhece alguma história inusitada sobre essa sede desenfreada de consumo. Um amigo me contou uma hoje que achei fantástica. Seu vizinho todo orgulhoso comprou uma TV de 52 polegadas com prestações a perder de vista. A aquisição foi grandiosa, uma verdadeira beleza. Quase não coube na parede da sala de tão grande. Mas no fim das contas estava lá instalada e pronta para ser desfrutada pela familia. O problema? Quando sentaram no sofá para apreciar o primeiro programa perceberam que como a distância entre a parede e o sofá era pequena a imagem mal cabia nos olhos. Fico imaginando só a cena da família afastando a cabeça para trás procurando o ângulo para ter a dimensão completa do que apresentava a TV. Mas isso não podia ficar assim e a solução rapidamente foi dada. A parede que separava o quarto do filho da sala foi ao chão e uma nova foi erguida com o garoto agora em um quarto que mal lhe cabe a cama. Problema resolvido.

Seria cômico.... se não fosse trágico.

5 comentários:

  1. Esse sentimento de consumo é quase "sem cometários", né! Porque se trata de um comportamento doentio, se o emocional está saudável não há tanta necessidade de criar necessidade...mais uma doença causada pelo capitalismo! Lastimavel!

    ResponderExcluir
  2. Sim, uma doença, mas no caso uma verdadeira epidemia na medida em que afeta praticamente a todos os moradores das grandes cidades ou que de alguma forma tem acesso aos meios de comunicação de massa.

    ResponderExcluir
  3. putz! diminuíram o espaço do filho pra aumentar o espaço da tv?!?!

    olha, eu, na minha ingenuidade, pensei, até o final, que tivessem trocado a porcaria por alguma coisa com alguma serventia! eu não tenho tv, vc acredita?

    pessoal num pensa!

    e fiquei aliviada de precisar clicar pra saber quem é esse bottini :P

    se dependesse de mim, a sociedade de consumo teria outro nome! mas, morando em sp, eu sou praticamente uma aberração.

    essa é uma coisa a ser debatida sempre. precisamos do quê, afinal de contas? manipular os desejos, transformando-os em bens a serem consumidos é uma das muitas faces cruéis do capitalismo. gera muita ansiedade e insatisfação. mas, estranhamente, essa insatisfação não alimenta o desejo de mudança, mas reforça o status quo.

    será isso um viés em função do grupo pelo qual circulo?

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Sou daqueles que levo muito a sério Marx quando ele diz que "a existência determina a consciência". Então se for pra tentar responder sua última pergunta (será isso um viés em função do grupo pelo qual circulo?), eu diria "com certeza, minha amiga".

      Agora, sobre até quando você vai seguir resistindo às tentações da sociedade de consumo, bem... aí são outros 500. Ela tem muitas formas de atuar. Me lembra muito aquela musiquinha cantada pela Cássia Eller sobre a Cuca: "Cuidado com a Cuca que a cuca te pega e pega daqui e pega de la". :)

      Abraços

      Excluir
    2. A existência determina a consciência até o ponto de obliterar a mente, momento em que passamos a enxergar (ou entender) a realidade segundo as nossas certezas? Até o momento em que passamos a ver o que queremos e do modo como queremos ver? Não é a consciência, ao mesmo tempo, agente de transformação da existência?

      *

      Nem sempre resisto (não dá! qdo a gente resolve uma compra, a decisão pelo modelo/marca é justamente o momento da cuca!). Sou apenas muito seletiva (ou iludida, talvez?) com o que consumo. E tento perceber as razões que me fazem desejar objetos/produtos/comportamentos. Muitas vezes me rendo. Mas gosto de perceber quando. No entanto, pode ser apenas ilusão do controle, uma outra forma de nos referir à ilusão das escolhas.

      *

      Muito bacana a referência. Cássia, ótima companhia. Como sempre! \o/

      []’s

      Excluir