quarta-feira, 28 de agosto de 2013

"Mais médicos" é um programa escravocrata?


O programa "Mais médicos" do governo Dilma merece críticas e muitas. Mas as que a grande mídia faz e que são reproduzidas pelo grande senso comum merecem críticas ainda maiores que o próprio programa do governo. Um dos argumentos que primeira chama atenção e que precisa ser colocado devidamente em seu lugar é a de que os cubanos vêm ao Brasil para trabalhar em regime análogo à escravidão.

Talvez seja difícil para um brasileiro entender como um médico pode viver no interior do país com 2500 a 4000 reais, deixar 3000 reais com o governo cubano e outros 3000 a 4500 com a família que ficou em Cuba. Podemos discutir se concordamos ou não com esse modelo de remuneração mas se chamamos isso de escravidão então precisamos definir o que não é escravidão.

Por acaso o que remete à ideia de escravidão é o valor nominal de 2500 a 4000 reais? Até entendo que um médico brasileiro se negue a viver com um valor como esse mas é bom que se lembre que o salário mínimo brasileiro é R$ 678,00 e não são poucos os que vivem do mínimo. Por acaso isso é escravidão? Não, não é! É injusto e miserável mas não é escravidão, nem mesmo semi-escravidão.

O problema seria então pelo fato dos cubanos trabalharem no serviço público sem concurso público e recebendo bolsa ao invés de salário formal? Isso é que é trabalho escravo? A terceirização então é o que? Não são poucos os trabalhadores que trabalham no serviço público como terceirizados e que recebem seus vencimentos por meio de uma cooperativa ou outra empresa que por sua vez ficam com boa parte do dinheiro pago pelos serviços prestados por esses trabalhadores. Terceirização é escravidão? Não, não é! É um instrumento de opressão e super-exploração que não garante direitos iguais para trabalhadores e que precisa ser combatido, mas escravidão não é.

Seria o problema o fato de mais da metade da bolsa paga pelo governo brasileiro não ficar diretamente com o médico? É isso? Bem... brasileiros vivem ilegalmente nos Estados Unidos fazendo serviços os mais diversos e nas relações mais precárias e imagináveis o possível e repassam a maior parte do que ganham para suas famílias ficando somente com o suficiente para sobreviver no país do Tio Sam. Isso é escravidão? Não, não é. É aviltante e revoltante mas não é escravidão.

Então qual é o problema? Seria porque são cubanos e vivem em um país onde não existe a cultura da acumulação pessoal até porque a saúde é pública, o transporte é público, a educação é pública e ser médico não é o sinônimo de ser rico? Seria isso? Nem discuto se Cuba é comunista (que não é por mais que tanto Fidel como a direita raivosa e parte da esquerda digam que é). Isso honestamente não vem ao caso, ou pelo menos não deveria vir. A questão é saber se o trabalho dos cubanos no país se constitui em trabalho escravo por, por exemplo, serem de Cuba. E a resposta é que é claro que isso não é escravidão.

Pode-se discutir que o programa Mais Médicos é eleitoreiro e não resolve o problema da saúde pública no país. Isso sim, faz sentido e precisa ser muito discutido. Mas todo o resto não passa de um discurso irracional e preconceituoso. No fim das contas a única coisa que nos remete à escravidão no argumento de trabalho escravo dos médicos cubanos é a mentalidade escravocrata de quem o utiliza.

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